quarta-feira, julho 22, 2015

Quanto queremos gastar com o Estado, pergunta o gajo

Fiel á velha tese do povo que comeu bifes da vazia quando devia ter-se ficado pelas asas de galinha Passos Coelho decidiu teorizar sobre a sua abordagem da política económica digna de um taberneiro, sugerindo que a política fiscal deve estar condicionada a uma decisão prévia sobre quanto se pretende gastar no estado social. Para o nosso taberneiro a política económica não existe e funcionamento do Estado tem duas partes, de um lado comem-se as salsichas e do outro está a máquina de fazer salsichas.
  
A lógica é simples, se queremos salsichas com baixo teor de gordura teremos que meter mais carne limpa na máquina e isso implica mais dinheiro. Segundo esta abordagem primária a política fiscal é apenas uma forma de fazer dinheiro e a despesa pública depende apenas dos recursos financeiros que se pretende gastar. Não sei se foi isto que a Maria Luís Albuquerque lhe ensinou na Lusíada  ou se Passos Coelho andava mais ocupado com as discotecas  e foi avaliado com base em discursos dos tempos da jota. Mas sei que isto é mais do que um enviesamento ideológico, revela também uma ignorância de bradar aos céus.
  
Passos Coelho tenta iludir-nos passando a ideia de que os impostos servem apenas para pagar despesa, precisamente o contrário do que fez. Quando Passos Coelho aumentou o IRS e diminuiu não estava a cobrar mais impostos para pagar as salsichas, uma parte dos impostos que cobrou em IRS serviu para os entregar às empresas sob a forma de reduções do IRC. Portanto, Passos Coelho também poderia dizer que antes de se decidir qual o montante da sobretaxa do IRS deve saber-se quanto do IRS se pretende dar aos patrões sob a forma de reduções do IRC, de benefícios fiscais vários ou de perdões fiscais.
  
Poderiam ser dados muitos exemplos de situações em que o aumento dos impostos serviu para pagar muita coisa que não foram referidas na tese desenvolvida pelo ainda e infelizmente primeiro-ministro. Poderia, por exemplo, dizer que antes de decidirmos o que queremos gastar em universidades temos de perguntar antes á senhora Merkel quantas centenas de médicos, enfermeiros e engenheiros portugueses formados com o dinheiro dos nossos contribuintes e que irão à borla para a Alemanha, ali contribuindo para que os alemães mais velhos possam viver para o Algarve, onde podem beneficiar das estradas, hospitais e outras infraestruturas sociais sem pagar impostos.
  
Se olharmos ao que este governo tem feito a pergunta o paradigma da política fiscal devia ter sido colocado de outra forma. Quantos mortos deixados ao abandono nas urgências de Paulo Macedo estamos dispostos a aceitar apesar de pagarmos uma brutalidade em impostos, suportando uma carga fiscal muito acima do aceitável? Quanto estamos dispostos a pagar a mais em IRS para financiarmos a descida do IRC, os perdões fiscais e os milhares de estágios em empresas que mais não são do que o financiamento com impostos (IRS e IVA) de mão de obra barata e sem contrato? Quantos alunos estamos dispostos a meter dentro de uma sala de aula sabendo que uma boa parte desses estudantes serão desempregados ou emigrantes?